Estado do Rio Grande do Sul poderá ter lei anti-fracking
Depois de dois dos três estados
da região Sul do Brasil garantirem por legislação estadual a proibição do
fracking (fraturamento hidráulico), uma técnica utilizada para a extração
de gás de xisto ou folhelho que ficam a mais de 800 metros de profundidade,
chegou a vez do Rio Grande do Sul. O fracking é uma técnica considerada
não-convencional e, por seus riscos e consequências, foi proibido no
Paraná, em Santa Catarina e em mais de 400 cidades de todo o país. O país
vizinho dos gaúchos, Uruguai, está discutindo uma lei nacional para proibir
a técnica.
De acordo com a minuta do projeto
de lei que deve tramitar na Assembleia Legislativa gaúcha no mês de março,
fica proibido, no território do Estado do Rio Grande do Sul, a exploração e
a produção de óleo e gás de xisto (óleo e gás de folhelho) pelos métodos de
fratura hidráulica (fracking) e de mineração convencional com retortagem e
pirólise, ou outros métodos que possuam riscos efetivos ou potenciais de
danos a tais métodos atributos. A iniciativa é da deputada Luciana Genro,
que espera ter mais colegas como co-autores.
De acordo com o geógrafo e
pesquisador do Instituto Internacional ARAYARA, Luciano Henning, atualmente
pós-doutorando da UFRGS, no Rio Grande do Sul existem pelo menos 190
municípios com potencial de exploração de gás de xisto por fracking. As
cidades ficam nas regiões noroeste, centro-ocidental e sudoeste.
Como funciona
Através de perfurações no solo,
são injetadas grandes quantidades de água com solventes químicos
comprimidos. Alguns possuem, inclusive, potencial cancerígeno. A enorme
pressão gerada pela água provoca explosões que fragmentam a rocha.
Fraturada a rocha, é preciso
garantir que o buraco não se feche novamente. Para isso, é inserida uma
quantia elevada de areia que, supostamente, evita que o terreno ceda e, ao
mesmo tempo, por sua porosidade, permite a migração do gás a ser extraído.
Esse processo pode criar novos caminhos para a liberação do gás ou pode ser
usado para ampliar os canais já existentes.
Os resultados são desastrosos:
estudos mostram que mais de 90% de fluidos resultantes do fracking podem
permanecer no subsolo. Já o flowback, ou seja, o fluído do
fraturamento que retorna à superfície e que normalmente é armazenado em
lagoas abertas ou tanques no local do poço, também causa impactos como a
contaminação do solo, ar e lençóis de água subterrânea.
Renan Andrade, gestor ambiental e
representante da 350.org no
Rio Grande do Sul alerta que a prática do fracking gera danos irreparável
ao meio ambiente e à produção agrícola. "Na Argentina, país que faz
fronteira com o Rio Grande do Sul, o faturamento hidráulico comprometeu a
cultura da maçã, por exemplo. Onde é praticado o fracking no mundo, dá
errado. Por isso o trabalho da Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima,
Água e Vida (COESUS) é tão importante: é preciso alertar a sociedade antes
que os danos aconteçam", afirmou.
Para Andrade, o RS precisa
aprovar a legislação sob pena de ter penas econômicas significativas.
"Os gaúchos vivem uma crise financeira muito grave. Em poucos anos, se
nada for feito pelos parlamentares gaúchos, a crise pode piorar porque
Paraná, Santa Catarina, Chile e outros locais terão preferência na
exportação de produtos agrícolas com o selo 'fracking free'. Ainda é tempo
de os gaúchos agirem", alertou.
Otimista com a aprovação da
pauta, Juliano Bueno, diretor da COESUS, lembra que o tema é
suprapartidário. "No Paraná, o texto foi proposto por parlamentares do
PSC, do PDT e do Cidadania; e foi sancionado pelo Governador Carlos Massa
Ratinho Júnior (PSB). No PR, foram quase seis anos de campanhas de
mobilização com o apoio de cooperativas, autoridades, ONGs e sociedade;
realizamos pesquisas científicas, trabalhos com legisladores e
especialistas. Já o projeto catarinense foi proposto por um parlamentar do
MDB, e sancionado pelo Governador Carlos Moisés da Silva (PSL)", explicou.
"Tenho plena convicção que os deputados gaúchos legislarão para
garantir aos milhões de cidadão que vivem em solo gaúcho saúde, produção
agrícola sustentável e disponibilidade de águas limpas", acrescentou.
Mas afinal, quais são os danos
gerados pelo fracking
Mudanças Climáticas
Além de distrair a indústria geradora de energia e o governo da necessidade
do investimento em fontes renováveis de energia, o processo de exploração
por meio do fracking emite metano — gás 25 vezes mais potente que o dióxido
de carbono (CO2), contribuindo cada vez mais para o agravamento das
mudanças climáticas.
Consumo de água
Cada poço de fracking utiliza aproximadamente de 7,8 a 15,1 milhões de
litros de água. Geralmente, essa grande quantia é transportada para o local
do fraturamento por vias terrestres, em caminhões movidos à diesel,
representando um custo ambiental significativo – visto que vivemos em meio
a uma crise hídrica. Em West Virginia (EUA), são injetados aproximadamente
19 milhões de litros de fluido em cada poço fraturado e, de toda a água utilizada,
apenas 8% retorna à superfície.
Contaminação
A água utilizada no procedimento é misturada com areia e cerca de 150 mil
litros de até 600 produtos químicos, incluindo substâncias cancerígenas e
toxinas conhecidas, tais como urânio, mercúrio, metanol, rádio, ácido
hidroclorídrico, formaldeído, entre outras. Esses produtos podem escapar e
contaminar as águas subterrâneas em torno do local. Para se defender, a
indústria sugere que os incidentes de poluição são resultados de má
prática, em vez de se tratar de uma técnica inerentemente arriscada.
Terremotos
O fracking provoca, habitualmente, microssismos que podem desencadear em
tremores maiores, sentidos pelas populações locais. Por vezes, estes
eventos são aproveitados para obter um registro vertical e horizontal da
extensão da fratura. Embora esses terremotos sejam crônicos, a injeção de
água proveniente das operações de fracking pode causar tremores maiores,
tendo-se registrado magnitudes de até 5,7 (Mw).
Além disso, os sismos têm se
tornado cada vez mais frequentes. Em 2018, por exemplo, a cidade de
Lancashire (UK) apresentou 17 terremotos em apenas nove dias – fato
ocorrido após a cidade ter retomado as atividades de fraturamento
hidráulico. Entre janeiro de 2010 e maio de 2017, o Serviço Geológico dos
Estados Unidos (USGS) mediu 8.908 terremotos ocorridos no estado de
Oklahoma, com uma média de 218 sismos por mês.
OCUPAÇÃO DE TERRAS
Outra consequência causada pelo fracking é o alto índice de ocupação de
terras devido às plataformas de perfuração, áreas de estacionamento e
manobra de caminhões, equipes, instalações de processamento e transporte de
gás, bem como estradas de acesso, que em casos de poços na Amazônia, podem
ser vetores do desmatamento.
Por esses e muitos outros
motivos, a Coalizão Não Fracking Brasil está nesta luta ampliada contra o
gás da morte, dedicando-se no desinvestimento do hidrocarboneto garantindo,
portanto, que as mudanças climáticas não sejam ainda mais solidificadas.
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