9/29/2018

Atlas do Agronegócio é lançado em Curitiba com a presença de Bel Coelho

por Franciele Petry Schram (Terra de Direitos)m

Publicação reúne informações sobre a cadeia agroindustrial no Brasil e no mundo.
A concentração da produção de alimentos pelas multinacionais tem prejudicado a variedade alimentar dos brasileiros. Foi isso o que apontou a chef e apresentadora Bel Coelho, durante o lançamento do Atlas do Agronegócio, em Curitiba. A publicação, produzida pelas Fundações Heinrich Böll e Rosa Luxemburgo, foi lançada na capital paranaense na noite desta terça-feira (25).
Durante a atividade, que reuniu cerca de 100 pessoas, Bel Coelho analisou os resultados de uma pesquisa que vem desenvolvendo há seis anos. A chef, conhecida por valorizar ingredientes nativos e regionais em suas receitas, viajou por todas as regiões do país e percebeu que muitas pessoas desconhecem ingredientes de biomas brasileiros. “Isso quer dizer que a indústria nos condicionou a comer poucas coisas”, avalia.   
Essa constatação está muito próxima das reflexões trazidas no Atlas do Agronegócio. Os 22 capítulos contêm informações para um debate sobre a cadeia agroindustrial no Brasil e no mundo e os aspectos que envolvem a produção mundial de alimentos. Em 58 páginas, a publicação analisa os processos de fusões de transnacionais, a organização de conglomerados, a concentração do mercado de sementes e agrotóxicos e até mesmo de concentração de terras no país. O material já havia sido lançado no Rio de Janeiro, no início do mês.
Segundo o material, cinco corporações dominam o mercado global de produtos agrícolas. O Brasil é campeão mundial na produção de alimentos geneticamente modificados e no consumo de agrotóxicos.
 “O Atlas percebe que agronegócio não é tão pop como se tem dito por aí. Esse processo de concentração na produção por parte das corporações distancia o produtor do consumidor, e impede que a gente escolha aquilo que quer comer”, explica Maureen Santos, coordenadora de projetos socioambientais da Fundação Henrich Böll Brasil e coorganizadora do Atlas do Agronegócio.
Agro é pop?
Vice-presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos e coordenador da Terra de Direitos, Darci Frigo também ressalta que é preciso olhar com ceticismo para o slogan que circula na televisão destacando que “agro é pop”. “O que é agronegócio? É uma produção em larga escala de produtos agrícolas – que pode ser de alimentos –, mas que tem objetivo central o lucro, não a alimentação das pessoas”, esclarece.
Bel Coelho concorda com a afirmação. “O agronegócio não se preocupa com uma alimentação saudável, porque ele quer uma alta produtividade para exportar, para alimentar boi. Não é para alimentar gente”, avalia. “Isso tudo em detrimento da nossa saúde, da saúde do solo e da saúde do homem do campo, que é o primeiro a se prejudicar com o emprego de agrotóxico”.
A chef lembrou que o Brasil consome 20% do veneno agrícola produzido no mundo. O Paraná está entre os três estados que mais utilizam agrotóxicos no país. “Esse veneno que a Europa não quer mais comprar e é despejado aqui, e a gente aceita. Aceita porque os ruralistas têm muito dinheiro, e podem ajudar no financiamento de campanha ou para benefício próprio”, destaca.
Uma das autoras do Atlas, a professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Claudia Schmitt também chamou a atenção para as fusões de empresas do agronegócio. Dessa forma, elas não apenas concentram apenas grandes valores financeiros, mas também conhecimento. Segundo a professora, é comum que essas empresas criem mecanismos de propriedade intelectual para que outras pessoas não possam acessar esses conhecimentos ou os produtos da biodiversidade.
No Brasil, tramita no Congresso Nacional um projeto que pretende alterar a atual Lei de Cultivares, para ampliar o controle da indústria sobre as sementes. “Não está muito longe do dia que a gente vai ter que pagar royalties para cultivar uma muda de planta em um vasinho em nossa casa”, alerta Claudia.
Outro modelo possível
Apesar do discurso de que agronegócio é sinônimo de desenvolvimento, experiências mostram que é possível desenvolver outros modelos que aliam desenvolvimento econômico, ambiental e social. É o caso do Acampamento José Lutzenberger, de Antonina, no litoral do Paraná. Há 16 anos, 20 famílias produzem de forma agroecológica através de agrofloresta, um sistema que produz alimentos em sintonia com a recuperação de florestas.

A área, que antes era degradada por causa da criação de búfalos, hoje produz alimento sem veneno ao mesmo tempo em que recupera a Mata Atlântica.  Em 2017, o acampamento recebeu o prêmio Juliana Santilli, na categoria ampliação e conservação da agrobiodiversidade. Os alimentos são comercializados e distribuídos para escolas da região por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
“Através desse processo a gente conseguiu mostrar que é possível ter um desenvolvimento produtivo que respeite o bioma, que a produção não é conflituosa com áreas de conservação, e contribui na recuperação das áreas degradadas”, conta o agricultor Jonas Souza, coordenador do acampamento do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).
Os moradores da área, no entanto, são ameaçados de despejo por uma determinação judicial. Para impedir que as famílias sejam retiradas do local, um coletivo de entidades organiza a campanha Agrofloresta é nossa casa.
Promover a reforma agrária, segundo Jonas, é permitir o desenvolvimento de produção de alimentos saudáveis e a preservação dos biomas: “A reforma agrária é uma forma de contrapor esse modelo hegemônico do agronegócio”, avalia.
Acesse aqui a versão digital do Atlas do Agronegócio
Fonte: Terra de Direitos.

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